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18.4.23

Youssou N'Dour/Neneh Cherry - "7 Seconds"


Fiquei sabendo deste artista através de um belo texto
do escritor senegalês 
Boubacar Diop,
"Carona, vilarejo planetário", que li há mais de
dez anos anos (pelo link ao lado, o texto e sua
fonte em português podem sem encontrados). Acho essa
música muito bonita, ouço-a sempre pelo rádio. Deveria 
estar aqui há mais tempo, mas tudo tem a sua hora, o difícil é explicar a hora. Só há poucos dias é que encontrei
este vídeo clip, muito interessante, a meu ver.
Espero que gostem...leiam o texto...e comentem, se não
lhes peço muito. 

6 comentários:

  1. Nossa, professor, que texto, muitas coisas na cabeça e não sei nem por onde começar. Talvez, eu começasse por algo que tenho percebido se alastrar: artistas bem menos conhecidos, frustrados com a "algoritimização" da vida, o que afeta diretamente suas produções, fazendo com estes passem mais tempo produzindo mais chantilly do que o próprio bolo. Dizem hoje que, sem esse chantilly, você não é visto, não viraliza, não ganha dinheiro. Mas como fazer chantilly se não tem nem o bolo? Será que se precisa do bolo, hoje em dia? E essa semana, algo que me surpreendeu e gerou um ponto de inflexão sobre esses questionamentos, a qual também compartilho, foi ler artistas grandes frustrado com essa mesma algoritimização, gente da nova geração, da velha geração, todos cansados e sem perspectivas dos rumos que as coisas estão tomando, ao ter que ficar produzindo conteúdo nas redes invés de efetivamente fazer arte.

    Paralelamente, vem outra discussão pertinente, o financiamento dos artistas, a disputa estado versus multinacionais citadas pelo Boubacar Diop. E vou mais além, porque junto com essa disputa do que cabe em cada quadradinho dessa disputa, ainda há uma crise mundial que faz com que, independente de ser fomentado por uma lei de incentivo municipal ou um grande banco privado que apoia a cultura, os editais diminuíram em tamanho e em investimento. Hoje, a indústria da guerra parece muito mais atrativa para alguns. Isso desagua diretamente em nós, artistas, que nos vemos constantemente reféns desses dois tipos de fomento para se viabilizar, o que acho bastante complicado. Mas é uma discussão longa, que vai desde se ter uma boa distribuição de renda no país para que as pessoas possam acessar espaços de arte, adquirir arte, consumir (no melhor sentido da palavra, se é que existe) arte, e simultaneamente, ver a arte como algo fundamental, tanto quanto outros bens. Mas em países onde não se tem nem para comer, tudo fica dependente ao público e ao privado. (continua)

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  2. Vejo muitos conglomerados estrangeiros do ocidente levarem artistas do Sul para expor seus trabalhos, darem cursos, serem vistos, ouvidos, mas ao mesmo tempo, me soa sempre uma culpa cristã, de, "quero pedir desculpas pela colonização e os genocídios", colocando esses artistas em uma espécie de mostruário, como exóticos, não muito diferente do que se fazia em outros tempos, mas agora com um verniz da civilidade, da democracia. Esses artistas, que poderiam fazer e construir coisas importantes em seus países gerando transformações importantes, se vem em um grande dilema, já que em sua pátria natal, são pouquíssimos os apoios e fomentos, e há todo um emaranhado de questões subterrâneas que são faíscas para rusgas geopolíticas. Imagine, para um conglomerado de mineiração do ocidente, ver uma artista indígena produzindo arte contestadora para o público de sua terra natal sobre os povos originários e a luta por seus territórios, tão ricos em minérios?

    Há ainda, outra camada, o que Diop traz de uma massificação da cultura, de sermos cunhados como moedas, padronizando-nos, o que afeta diretamente todos os atores deste processo, de quem interage com uma produção artística e quem a produz. É outro assunto muito complexo, porque se pensamos, por exemplo, as plataformas de streaming, há sempre novas produções a serem vistas, uma indústria que gera emprego em várias fases do processo, mas por outro lado, nos deparamos constantemente com uma marca d'água conceitual em tudo o que assistimos, toda produção do Netflix tem a mesma cara, assim como muitos dos filmes nos cinemas parecem beber da fonte de super heróis, o que soa, como o quadrinista Alan Moore diz em entrevista para o Vitralizado, uma infantilização da cultura, como se esse tipo de história fosse a única coisa que as pessoas hoje em dia dessem conta, precarizando as visões de mundo. Não é a toa o surgimento por todo o mundo de supostos super heróis que vão salvar o país da corrupção, dos estrangeiros e de outras conspirações que parecem ter saídas de um gibi.
    Encerro meu comentário, que já se tornou algo mais além disso, mas creio que esse texto do Boubacar se desdobrou em tantos bons questionamentos, que vale mais a pena um café com o senhor para conseguir abordar tanta coisa. Temo ter ido mais além em algumas partes, mas achei que cabiam também.

    Um abraço, professor, e obrigado por compartilhar o texto incrível e a bela música.

    Raphael Morone

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  3. Muito obrigado pelo comentário, Raphael. Continue por perto. E o nosso café... que seja breve, com muita alegria para mim. Grande braço

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  4. Muito bom Mário. E sempre uma grata surpresa. Não conhecia, que outro modo haveria, se não fossem as indicações dos amigos! As preciosidades humanas de todas as partes do mundo!
    O belo texto de Boubacar Diop ressalta a visão profundamente crítica, mas, sobretudo, a sensibilidade das observações.
    Destaco a pontuação sobre esses paradoxos deletérios de nosso tempo: o fato de a Internet possibilitar tantos encontros culturais e, ainda assim, trazer algo de insano com a política de distanciamento de raízes xenófobas. O xenófobo é mais assustador do que a expressão de sua caricatura, pelo fato de que “ninguém o distingue da pessoa comum”. A abertura do que o autor chama com propriedade de caixa de Pandora deflagrou o excesso de rancor que permanecia oculto. As redes sociais e os hábeis recursos da comunicação moderna, ao invés de revelar o sentido do diálogo, nos lançam cada vez mais na dimensão da surdez coletiva.
    O texto é rico em referências, evoca a um só tempo a crítica à indústria cultural como também os efeitos culturais da infantilização do grande público, mais apto ao consumo de receitas prontas, com resultados previsíveis, do que à reflexão.
    Devo destacar, especialmente, a crítica sobre a divisão e o distanciamento cada vez maior entre o Norte e o Sul. Não só isso, mas exatamente o enfraquecimento das relações Sul-Sul, o que é mais preocupante.
    Para finalizar o comentário, reproduzo a referência ao conselho de Cheikh Hamidou Kane: devemos guardar nossas almas em um lugar seguro.

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  5. Renato Silva4/20/2023

    Olá Mário,
    Muito obrigado pela música, pelo vídeo e pelo texto.
    Ouço esta música constantemente, acho linda, mas nunca tinha visto o vídeo e é excelente. Entendo como aquelas criações eternas em que tudo se encaixa – letra, som, performance, imagens – um daqueles momentos luminosos.
    Não conhecia o texto. Também excelente, daqueles que a cada leitura se revela mais um pouco.
    Nosso tempo tornou tudo urgente e nos trouxe junto a clareza de nossa rápida passagem, com isso, percebo que a urgência de uma existência individual verdadeira nos levou a um isolamento muito grande e a um excesso de cuidado em manter distância do outro. Esse distanciamento é claro faz parecer estranho tudo aquilo que não me é igual. Então, temos uma leitura da história e do tempo que nos mostra todos os nossos erros, o tanto que precisamos ajustar os ponteiros com a nossa existência entendendo que dela fazem parte todos os outros, que nossa cultura, nossas crenças, nada significam sem os diferentes delas.
    Entretanto - quero estar enganado - percebo que ainda temos uma clareza teórica e social, sobre reconhecer, entender e conviver com as diversas culturas, mas estamos com uma dificuldade enorme de cultivar a verdade individual e entender que o outro faz parte dela.
    Valeu!
    Abraço.

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