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31.5.21

"Alvorada", o documentário de Anna Muylaert e Lô Politi


Sobre o documentário:
É tudo verdade - debate com as diretoras Anna Muylaert e Lô Politi

"Na intimidade do Palácio da Alvorada, o cotidiano da presidente Dilma Rousseff, primeira e única mulher a governar o Brasil, durante o desenrolar dramático do impeachment que a tirou do poder. Rodado entre julho e setembro de 2016, o filme testemunha a tensão e a perplexidade que escalavam no círculo da presidente, em reuniões, telefonemas intermináveis e sussurros ouvidos da cozinha à guarda do palácio de Oscar Niemeyer. Ao mesmo tempo, revela uma personalidade surpreendente nas conversas informais em que Dilma fala de política, história, literatura – e de si própria."

30.5.21

Sérgio Sant´Anna: A arte de não escrever

 "Muito já se escreveu sobre a arte da poesia, ou da narrativa, mas nada sobre essa outra arte tão dura e demandante de rigor que é a de silenciar quando não se tem o que dizer, ou o desejo de dizê-lo, ou, principalmente, os recursos para tanto. Este pequeno ensaio visa a preencher essa lacuna para aqueles que se iniciam na atividade literária, ou aqueles, veteranos, que se veem impelidos a continuar simplesmente porque começaram.

Aos aspirantes a escritor que se sentem torturados pela desconfiança de que não têm aptidão para o ofício, pode-se dizer que, quase sempre, estão certos. Mas é bom lembrar que somente os que duvidaram da própria incapacidade, através da ação, tiveram a oportunidade de confirmá-la. E também que escrever talvez seja, em grande parte dos casos, muito mais o exercício de uma vontade, às vezes férrea, do que a realização de uma vocação irreprimível, como aquela de um Rimbaud (mesmo assim parou logo) ou de um Jarry, que escreveu o seu primeiro Ubu para gozar um professor." (Trecho de O conto não existe, do escritor Sérgio Sant´Anna)

Cartas de Benjamin para Adorno (1928-1940)


Foto: Página 12

"Las compila el volumen Correspondencia, de Eterna Cadencia. Su lectura es la posibilidad de abordar en forma directa el documento de un vínculo intelectual sobre el trasfondo histórico del auge del oscurantismo en Europa. Es, además, el relato enhebrado en el tiempo de las afinidades y diferencias entre ambos autores [...]
La lectura de esta correspondencia no es sólo una recuperación para nuestro ámbito intelectual de una pieza fundamental en el materialismo heterodoxo, en la filosofía en general, sino también una puerta para ver el “instante de peligro” que el fascismo abrió dentro del pensamiento occidental, donde la calma necesaria del trabajo de lectura e interpretación se realizaba siempre en el marco de exilios forzados, de persecuciones y en pleno derrumbe de esa Europa que hoy constituye el todo conjurado fragmentariamente por estas cartas. Un mundo ruinoso cuyo enigma aparece frente a nosotros en imágenes dialécticas, imágenes tan nuevas como viejas y, por eso, tan poderosamente presentes."

 

29.5.21

Marilena Chuaí: O “autoritarismo social” como origem e forma da violência no Brasil

"Desde a Idade Média até a Revolução Francesa, um homem se tornava rei por meio de uma cerimônia religiosa na qual era ungido e consagrado pelo papa. A cerimônia possuía quatro funções principais: em primeiro lugar, afirmar que rei é escolhido por uma graça divina, sendo rei pela graça de Deus, devendo representa-lo na Terra (ou seja, não representa os súditos, mas Deus); em segundo, que o rei é divinizado, passando a ter, além de seu corpo humano mortal, um corpo místico imortal, seu corpo político; em terceiro, que o rei é Pai da Justiça, isto é, sua vontade é lei (ou como diz o adágio: o que apraz ao rei tem força de lei); em quarto, que é Marido da Terra, isto é, o reino é seu patrimônio pessoal para fazer dele e nele o que quiser." (Texto da filósofa Marilena Chauí, publicado no site A terra é redonda em 27 Mai. 2021)

Christian Dunker: Narcisismo ressentido, o sintoma nacional que chegou ao poder



Para o psicanalista Christian Dunker, o presidente representa a “cultura de condomínio” brasileira: só quem reside nos espaços intramuros merece viver.


27.5.21

Cartas esparsas

Inicio aqui alguns posts que realizarei a partir, entre outros, do magnífico acervo de cartas do Instituto Moreira Salles, Correio IMS. Quanta história pode ser lida através da correspondência dos escritores... No próximo dia 28 de maio/2021, comentarei alguns desses belos documentos no programa do jornalista e amigo Vinícius Cabral no Facebook e You Tube.

“Cada um tem suas razões: para este, a arte é uma fuga; para aquele, uma maneira de conquistar. Mas pode-se fugir para um claustro, para a loucura, para a morte; pode-se conquistar pelas armas. Por que justamente escrever, empreender por escrito suas evasões e suas conquistas? É que existe, por trás dos diversos desígnios dos autores, uma escolha mais profunda e mais imediata, que é comum a todos. Tentaremos elucidar essa escolha e veremos se não é em nome da própria opção de escrever que se deve exigir o engajamento dos escritores.” (Jean-Paul Sarte, O que é a literatura?, Ática, 2004)

Do exílio, Augusto Boal escreve para os seus "caros amigos"

Carta de Augusto Boal para Chico Buarque

"Chico,

Ando nervoso, ansioso, querendo que esse julgamento recomece de uma vez,querendo ganhar de goleada, 10 x 2, mas aceitando um 7 x 6 e não querendo nempensar no contrário. Fico com os olhos grudados no telefone esperando um chamadode Brasília gritando “Ganhamos!”. Vai ser hoje, amanhã, quando? Vamos ver..." (Fragmento de uma carta. Buenos Aires, 3 Mai. 1976) 


Meus caros amigos - Augusto Boal - Cartas do exílio

Chico Buarque (1975)

Fernanda Montenegro (1984)

 

Carta de Ana Cristina Cesar para Caio Fernando Abreu


"Te escrevo, Caio querido, com teu telefonema ainda quente, deixo Proust de lado e a burocracia editorial da lista de nomes e endereços e ceps, que me consola como um álbum de figurinhas. Ando gemebunda. Aguardo bem o livro mas com aflição do número imprensa e dos falsos elogios dos amigos. Lançamento vai ser num lugar ideal, o que para mim significa: a dois metros de casa, nem saio da Baixa Gávea. Detestei fazer a tal biografia, redigi durante dias tentando não fazer número nenhum,atingir uma espécie de grau zero qualquer. Vã. Tomo decisões que não sei se cumpro:levantar cedo, fazer exercícios na praia; ler os clássicos; arrumar a casa. Tudo bem ao chão porque disseram que sou toda ar com o trio gêmeos/leão/libra (por ato falho escrevi “virgo”). Fiz o mapa. Lê pra mim? O astrólogo achei vago, geral demais, muito do perguntador, o que tirava o charme dos adivinhadores e fazia dele, embora americano tranquilo, um sacador de pistas que eu mesma dava. E tudo tão caro! Olha, meu corpo todo dói...". (Fragmento de uma carta - Rio de Janeiro 17 Nov. 1982)

 


   Foto: Centro Cultural Delfos

Cartas matam saudade de Ana Cristina Cesar
"Nas cartas, escritas a quatro amigas, três ex-professoras -Clara Alvim, Heloisa Buarque de Hollanda e Maria Cecilia Londres Fonseca- e uma colega de faculdade -Ana Candida Perez-, o que Ana C. faz não é dar respostas a seu ato, mas matar nos leitores a saudade de sua escrita."

    



Carta ao amigo, escritor e jornalista
João Silvério Trevisan

"Porto, 20. 11. 77 — domingo de sol

João Silvério, meu querido amigo:
recebi tua carta na semana passada. Eu fiquei contente/triste: contente porque a sua insegurança a respeito do meu querer-bem por você prova que o seu querer-bem por mim é verdadeiro; triste porque, nas entrelinhas, parece que você me supõe uma pessoa metida até os cabelos em badalações sociais e literárias. Respondi imediatamente. Só que não enviei a carta, como de outras vezes. Aliás, já te escrevi inúmeras vezes — mas nunca enviei. Faço isso muitas vezes (ninguém tem tantas cartas não-enviadas na gaveta como eu) —, às vezes por autocrítica exagerada, insegurança, falta de tempo, sei lá. O problema é que você nem chega a saber disso, então fica imaginando coisas..." (in Cartas, Org. Italo Moriconi, Aeroplano, 2002)

"Muitas cidades testemunharam a breve vida de Caio Fernando Abreu, morto em 1996, aos 48 anos. São Paulo, Santiago, Amsterdã, Berlim, Colônia, Porto Alegre, Paris e Londres são revisitadas no documentário “Sobre Sete Ondas Verdes Espumantes”, um roadmovie poético e afetivo que refaz o percurso do cultuado escritor. O filme, de Bruno Polidoro e Cacá Nazário, será exibido no Curta!.

Considerado um dos maiores contistas do Brasil, Caio abordou temas como solidão, medo, a certeza da morte, o sexo e a atmosfera política (ele mesmo foi perseguido durante a ditadura militar). Autor das obras-primas “Os Dragões Não Conhecem o Paraíso” e “Morangos Mofados”, ele se tornou amigo de importantes figuras do meio cultural. São justamente a memória e a literatura que conectam as amizades pelas diferentes partes do mundo onde Caio esteve. Espalhados por aquelas cidades, seus amigos — como Maria Adelaide Amaral, Luciano Alabarse, Grace Gianoukas e Adriana Calcanhotto — recorrem à sua obra e interpretam seus textos para, assim, celebrarem a existência do escritor." (Trecho da nota  publicada no jornal SP Norte)



"Carolina, bom dia!
Dia de sol nesse inverno de pandemia em São Paulo. Como você está? Espero que esteja em paz. Do lado de cá, temos feito a travessia no barco da coragem, como a vida exige.
Te escrevo da varanda da d. Ruth, ela foi passar dois dias no sítio em Parelheiros,enquanto eu limpo a casa, centímetro por centímetro, como ela recomendou. Ela foge das notícias de morte, não quer saber sobre os cinco corpos enterrados numa mesma vala, dos coveiros que trabalham tanto que não têm tempo para ter medo de contaminação pelo vírus silencioso e aniquilador. D. Ruth tem necessidade de paz para escrever. Você deve estar surpresa, mas a verdade é que precisei voltar ao trabalho doméstico. Esse mundo que se dilui no numerário das notícias desaba sobre minha cabeça e eu luto para respirar.
Consegui terminar a universidade em 2016, financiada por aquele programa do governo, dei aulas como professora eventual, mas mantinha algumas faxinas porque o salário miserável só era pago quatro meses depois da assinatura do contrato e,quando regularizou, fizemos greve por melhores condições de trabalho e os salários foram cortados. Eu ainda não consegui passar em concurso, não tenho tempo nem cabeça para estudar e, no tempo que tenho, trabalho para pagar os boletos e mandar o dinheiro das meninas. Agora, na pandemia, não tenho mais aulas, interromperam o contrato, trabalho três dias fixos aqui e atendo mais três casas de vez em quando." (Fragmento da carta "simbólica". São Paulo 8 Jul. 2020)
Sobre a escritora Cidinha da Silva

20.5.21

"José e Pilar", o documentário


Documentário dirigido pelo português 
Miguel Gonçalves Mendes (2010)

Com o mar por meio

 

Revista Blimunda

 





Foto publicada na capa da Revista Blimunda no. 3 - Agosto 2012 - Revista de estudos l
iterários da Fundação José Saramago. Este número da revista é dedicado aos 100 anos de Jorge Amado, e traz textos de textos de Luiz Schwarcz, Carlos Reis, Lilia Schwarcz e Pilar del Río. Neste número pode ser lido o belíssimo texto "Jorge Amado, vivo" que Saramago dedicou ao amigo Jorge (Acervo de Zélia Gattai). 

Fundação José Saramago

 "A Fundação José Saramago nasceu porque uns quantos homens e mulheres de diferentes países decidiram um dia que não podiam deixar sobre os ombros de um só homem, o escritor José Saramago, a bagagem que ele havia acumulado ao longo de tantos anos, os pensamentos pensados e vividos, as palavras que cada dia se empenham em sair das páginas dos livros para se instalarem em universos pessoais e serem bússolas para tantos, a acção cívica e política de alguém que, sendo de letras e sem deixar de o ser, transcendeu o âmbito literário para se converter numa referência moral em todo o mundo. Por isso, para que José Saramago pudesse continuar a ser o mesmo, soubemos que tínhamos a obrigação ética de criar a Fundação José Saramago e assim, dando abrigo ao homem, aumentarmos o tempo do escritor, sermos também a sua casa, o lugar onde as ideias se mantêm, o pensamento crítico se aperfeiçoa, a beleza se expande, o rigor e a harmonia convivem."

Os ilustradores dos livros de Jorge Amado







Parte da ilustração de Aldemir Martins para
Os pastores da noite (1964)

Posfácio de Zuenir Ventura

"O casamento de Martim e Marialva provoca rebuliço na cidade da Bahia. O menino Felício é batizado em uma igreja católica do Pelourinho, mas tem como padrinho uma divindade negra, o orixá Ogum. A ocupação do morro do Mata Gato obriga os moradores a enfrentar o proprietário inescrupuloso e a polícia.

Os pastores da noite é um romance formado por três episódios independentes, mas que guardam relação profunda entre si e personagens em comum.

Na primeira história, a notícia do enlace do cabo Martim com a bela Marialva espalha-se e atinge o estado vizinho, Sergipe. Mestre do jogo de cartas marcadas, o malandro provoca o ciúme da cafetina Tibéria. Marialva, por sua vez, desperta o interesse de outros homens, especialmente Curió, que se apaixona pela mulher do melhor amigo.

A segunda narrativa conta a história de um menino de olhos azuis, Felício, filho da alagoana Benedita e do negro Massu. Prestes a completar um ano, o bebê será batizado pelo pai em uma cerimônia religiosa marcada pelo sincretismo do rito católico com o candomblé.

O terceiro episódio relata a invasão do morro do Mata Gato. O dono do terreno consegue um mandado para expulsar a gente do local por meio da força. Negocia-se a desapropriação, e a medida agrada aos moradores. Mas a solução acaba revelando um jogo de interesses espúrios para beneficiar políticos.

As narrativas que compõem o livro caracterizam o universo da cidade de Salvador e do Recôncavo, onde os limites entre o convívio harmonioso e o conflito aberto são definidos diariamente. Em meio ao povo simples da Bahia, a solidariedade e a miscigenação são elementos que se refletem na amizade, no amor, na religião e no lugar onde se vive."
(Fonte: jorgeamado.com.br)

A arte de ilustrar Jorge Amado-1

A arte de ilustrar Jorge Amado-2

Jorge Amado, vida e obra

"Mais de 37 romances publicados e traduzidos para 49 idiomas, em uma produção que atravessa todo o século 20, tornam Jorge Amado um nome fundamental da literatura brasileira. A essa prolífica obra vem se somar a história do menino nascido em Itabuna que convivia com coronéis, cordéis e prostitutas. E a do intelectual combativo, frequentador da vanguardista Academia dos Rebeldes na Salvador dos anos 1920, militante do Partido Comunista Brasileiro (pcb) entre as décadas de 1930 e 1950 e deputado responsável pela lei de não perseguição às religiões afro-brasileiras. Com a publicação de romances folhetinescos e sensuais, o autor se tornou fenômeno editorial, sucesso ampliado pelas adaptações para cinema e televisão a partir da década de 1970, e consolidou de vez sua presença no imaginário popular."


Capitães da Areia (1989)


Filme dirigido por Walter Lima Junior, adaptação
do romance de Jorge Amado.

15.5.21

“Não Deixe Sua Cor Passar em Branco” (Sueli Carneiro)



“Nós, negros, temos pouco a dizer a respeito da direita, porque seu projeto sempre foi muito claro em relação a nós. Subalternização ou extermínio. Nosso lugar era limpar privada dos brancos”, afirma. “Quem nos prometeu o reino dos céus foi a esquerda. Estamos tentando obrigar a esquerda a entregar.” 

Entrevista com a filosofa e ativista Sueli Carneiro (Folha de são Paulo. Ilustrada. 07 Mai 2021. Foto: Bob Wolfenson)

Entrevistas com os escritores

"Los típicos libros de entrevistas suelen ser transcripciones de diálogos que muchas veces surgen en el marco de una coyuntura, como suele ser la aparición de un título nuevo de un autor. Pero esto es otra cosa: se pensó desde un comienzo como un rescate de esos pasajes de las charlas en que los mismos entrevistados descubren algo imprevisto en relación a la vocación o a la forma en que ejercen el oficio, eso que no tenían previsto decir, pero algún tipo de revelación irrumpe durante la misma conevrsación y los sorprende. Es lo que a veces sobreviene a ese silencio incómodo en el que el propio autor percibe qjue desconoce la respuesta, y entonces puede sobrevenir lo inesperado" (Verónica Abdala, autora de Café literário - la pulsión de escribir) 


13.5.21

Portinari: Retrato de Mário de Andrade (1935)


 

"Guerra e Paz"




Esta foto foi feita numa tarde quente de domingo, em 2013,
na exposição dos painéis Guerra e Paz (1952-1955),
no Cine Brasil - Vallourec, em Belo Horizonte.
Lembro sempre do dia em que eu vi (1958), pela primeira vez, uma 
foto destes painéis, publicada na revista O Cruzeiro, quando estavam sendo entregues pelo governo brasileiro à sede da ONU, em New York.

(João Cândido Portinari)


 

Entrevista com João Candido Portinari

"Ser um “portinari” — dizia a plaquinha com data de 914 rastreada na Internet — significava encontrar alegria na felicidade do outro, ajudar o próximo, emprestar o ombro."
(trecho da entrevista com o filho de Portinari, publicada pela Fundação Osvaldo Cruz)

Cartas de Mário de Andrade a Portinari

Alguns posts inspirados na leitura do livro Portinari amico mio - cartas de Mário de Andrade a Candido Portinari, Organização, introdução e notas de Annateresa Fabris (Editora Autores Associados, Campinas, 1995).



  Fragmentos do livro de Annateresa Fabris

Algumas obras citadas no livro acima podem ser vistas aqui. 
















         
      





7.5.21

"O homem amarelo", de Anita Malfatti


Ele traz uma aguda melancolia no seu olhar vago e distante.
Ainda que se apresente de gravata, seu paletó encontra-se visivelmente degastado e mal ajeitado no corpo contorcido, transpondo os limites da tela, característica comum aos trabalhos da pintora.
Seus olhos escuros são delimitados por contornos pretos, com espessas sobrancelhas em forma de acento circunflexo.
O modelo pintado encontra-se desajeitadamente na tela, que não o acomoda por inteiro, como se ali não o coubesse.
No seu espaço limitado, ele tem as duas mãos eliminadas pelo enquadramento.
Seu torso está inclinado para a sua direita, enquanto a cabeça reclina-se levemente para a esquerda.
Seus braços mostram-se arqueados. A postura de seu corpo deixa à vista sua tensão.
Ele se mostra oprimido.
A ansiedade do homem pode ser sentida através de sua expressão tensa e de seus olhos que perscrutam acima do ombro direito.
Seu rosto, voltado para a direita, deixa à vista apenas uma pequenina parte da orelha do mesmo lado.
As vestes do homem amarelo também revelam a sua apreensão.
Seu paletó está desalinhado, com a lapela direita quase roçando sua bochecha.
A gravata faz uma ligeira curva para a direita, sobre sua camisa branca manchada.
O quadro foi comprado por Mário de Andrade, conforme prometera à artista.
Ele disse: ´Estou impressionado com este quadro, que já é meu, mas um dia eu virei buscá-lo´.” (Interessante descrição do quadro O homem amarelo, 1916, de Anita Malfatti)

Os cadernos-diários de Anita Malfatti - Roberta Paredes Valin

"Este trabalho tem por objetivo analisar os cadernos de desenho da artista brasileira Anita Malfatti que remetem à sua estadia em Paris, entre 1923 e 1928, pelo Pensionato Artístico de São Paulo, todos salvaguardados pelo Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de São Paulo. A partir do mergulho nas muitas páginas desenhadas do universo íntimo da criação da artista, outros objetivos puderam ser alcançados. Primeiramente, a pesquisa retomou o debate acerca dos rumos da produção de Anita Malfatti pós 1917, compreendendo esse período como uma espécie de laboratório experimental sob a luz de um “particular Retorno à Ordem”, que antecede o que faria anos mais tarde em Paris. Em seguida, a pesquisa buscou reconstruir a trajetória da artista na capital francesa, recuperando sua passagem pelas academias e ateliês de arte, percurso esse fundamental para compreender sua produção pictórica no período em questão. Não obstante, uma análise mais aprofundada, no que aqui definimos como seus cadernos-diários da criação, possibilitou compreender suas principais obras, especificamente, A Mulher do Pará, La rentreé, Puritas e Ressurreição de Lázaro, a partir do diálogo com os esboços das próprias neles presentes. No que concerne à tela Ressurreição de Lázaro, a pesquisa reconstruiu seu trajeto de criação através da articulação de uma documentação de cunho pessoal, não só os cadernos de desenho, objeto de estudo desse trabalho, como sua correspondência com o escritor Mário de Andrade, e uma série de fotografias de pinturas célebres italianas tiradas pela própria artista, importantes referências do Trecento e Quattrocento italianos para o seu trabalho em Paris. Essa obra, contudo, por ser vista como obra-tese para o final do estágio, ganha um espaço importante nesse trabalho, uma vez que é definida como seu grande projeto pictórico, cujo início se dá ainda no primeiro ano em que a artista por lá esteve e sua finalização no mesmo ano de seu retorno ao Brasil. Deste modo, trata-se de uma pesquisa que busca compreender as obras da década de 1920 da artista à luz do seu processo de criação, cujos registros testemunham o percurso complexo do vir a ser das pinturas em que a artista dialoga conscientemente com a vanguarda e a tradição. " (Resumo da dissertação de mestrado de autoria de Roberta Paredes Valin).

Diário de Anita Malfatti retrata o início de sua carreira

“Trinta de maio foi sábado e dele só me lembro quando ao lusco-fusco apareceu Freitas Valle com todos seus satélites, sendo os principais Zadig e Elpons (…) quando mamãe perguntou se ele gostava do retrato de Georgina, disse ele – Minha senhora, não se ofenda se sou franco, mas esse quadro está crivado de erros, o desenho é fraco e é um carnaval de cores. O valor artístico não tem nenhum.”  (Matéria interessantíssima publicada no jornal da USP do dia 08/03/2017)

Mario de Andrade e a literatura epistolar

"Pós-Modernidade: tempo da velocidade, da imagem, da linguagem cifrada da comunicação digital. O que levaria uma jovem a interessar-se pela leitura de cartas manuscritas trocadas entre artistas (escritores e pintores), nas primeiras décadas do século XX? Talvez, quem sabe, a descoberta e o prazer, propiciados pela leitura, de voltar no tempo, um tempo marcado pelas mudanças trazidas pela modernidade: a luz elétrica, o bonde, as novas avenidas, os primeiros cafés." (Texto integral do artigo assinado por Ana Carolina Simões Fatecha, Sandra Maria Costa Cardoso e Verônica de Almeida Soares). Leitura recomendável

A revolução de Mario de Andrade

"Um país é especialmente contraditório quando dá as costas para aqueles que mais o defendem. Mário de Andrade fez muito pelo Brasil, mas foram necessárias sete décadas de ausência sua para que começássemos a fazer jus à sua suculenta obra artística e ao seu valioso legado de gestor cultural, ainda tão pouco analisado. Esse lapso por fim se vê ameaçado em 2015, ano em que se celebram os 70 anos de sua morte, com uma série de homenagens e conteúdos que pretendem jogar luz sobre sua marca modernista e também sobre sua trajetória pessoal." (Trecho da matéria publicada no jornal El País/Brasil, em 10 Maio 2015)

Ricardo Piglia - Bibliografia completa

Referência para interessantíssimo portal que contém arquivada a bibliografia do escritor argentino Ricardo Piglia.